Do lado de cá, eu sem noite de S. João.
Porque há S. João onde o festejam.
Para mim há uma sombra de luz de fogueiras na noite,
Um ruído de gargalhadas, os baques dos saltos.
E um grito casual de quem não sabe que eu existo.
MADRI - O escritor português e Prêmio Nobel de Literatura José Saramago morreu nesta sexta-feira, 18, em sua casa em Lanzarote (Ilhas Canárias) aos 87 anos de idade, informaram fontes da sua família.
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Entrevista: 'Deus não existe fora da cabeça das pessoas'
O escritor faleceu às 13 horas locais (8 horas em Brasília), segundo sua esposa e tradutora, Pilar del Rio. Ainda de acordo com ela, Saramago havia passado uma noite tranquila e, depois de tomar café da manhã com a mulher, começou a passar mal e faleceu em pouco tempo.
O autor recebeu o prêmio máximo da Literatura em 1988. Segundo a premiação, Saramago "nos permitiu mais uma vez apreender uma realidade ilusória por meio de parábolas sustentadas pela imaginação, pela compaixão e pela ironia".
A obra, intitulada "A árvore", passou a integrar o acervo do Museu Aberto da Sustentabilidade.
O artista paulistano Silvio Alvarez estará em Curitiba para apresentar os quadros de sua mais recente produção, a série "Arte e Sustentabilidade", de 16 a 22, na Casa do Artesanato. Alvarez também vai realizar uma oficina aberta durante a ReciclAção - Feira Brasileira de Reciclagem, Preservação e Tecnologia Ambiental, de 16 a 19 ministrará oficinas de colagem nos dias 21 e 22.
Silvio Alvarez trabalha com colagem desde 1989. Em seus trabalhos, com bom humor, retrata o cotidiano das grandes cidades, sem, contudo, deixar de lado uma análise crítica da sociedade. O artista costuma dizer que a principal matéria-prima do seu trabalho, ainda mais importante do que o papel, é a paciência. Silvio recorta, uma a uma, imagens de revistas ou de folhetos publicitários para compor um mundo todo seu, mágico e surreal.
Em 2009, durante a Semana do Meio Ambiente, deu importante passo em sua carreira ao produzir um painel para a Editora Abril, com a participação dos funcionários da empresa. A obra, intitulada "A árvore", passou a integrar o acervo do Museu Aberto da Sustentabilidade, na Praça Victor Civita, em São Paulo.
Mais informações www.silvioalvarez.com.br
Serviço:
Instituto Municipal de Turismo - Coordenação de Artesanato
Casa do Artesanato
Rua Mateus Leme, 22 - Setor Histórico
Informações com Lucilene Cristovam - 3250 7741
Feira ReciclAção
Monte Bello Eventos
http://www.montebelloeventos.com.br/reciclacao/
Informações com Valdir Bello - 3022 0383 - 3203 1189
Fonte: Paraná Online
Entender como aprendemos e o porquê de muitas pessoas inteligentes e, até, geniais experimentarem dificuldades paralelas em seu caminho diferencial do aprendizado, é desafio que a Ciência vem deslindando paulatinamente, em130 anos de pesquisas. E com o avanço tecnológico de nossos dias, com destaque ao apoio da técnica de ressonância magnética funcional, as conquistas dos últimos dez anos têm trazido respostas significativas sobre o que é Dislexia.
A complexidade do entendimento do que é Dislexia, está diretamente vinculada ao entendimento do ser humano: de quem somos; do que é Memória e Pensamento- Pensamento e Linguagem; de como aprendemos e do por quê podemos encontrar facilidades até geniais, mescladas de dificuldades até básicas em nosso processo individual de aprendizado. O maior problema para assimilarmos esta realidade está no conceito arcaico de que: "quem é bom, é bom em tudo"; isto é, a pessoa, porque inteligente, tem que saber tudo e ser habilidosa em tudo o que faz. Posição equivocada que Howard Gardner aprofundou com excepcional mestria, em suas pesquisas e estudos registrados, especialmente, em sua obra Inteligências Múltiplas. Insight que ele transformou em pesquisa cientificamente comprovada, que o alçou à posição de um dos maiores educadores de todos os tempos.
A evolução progressiva de entendimento do que é Disléxia, resultante do trabalho cooperativo de mentes brilhantes que têm-se doado em persistentes estudos, tem marcadores claros do progresso que vem sendo conquistado. Durante esse longo período de pesquisas que transcende gerações, o desencontro de opiniões sobre o que é Dislexia redundou em mais de cem nomes para designar essas específicas dificuldades de aprendizado, e em cerca de 40 definições, sem que nenhuma delas tenha sido universalmente aceita. Recentemente, porém, no entrelaçamento de descobertas realizadas por diferentes áreas relacionadas aos campos da Educação e da Saúde, foram surgindo respostas importantes e conclusivas, como:
que Dislexia tem base neurológica, e que existe uma incidência expressiva de fator genético em suas causas, transmitido por um gene de uma pequena ramificação do cromossomo # 6 que, por ser dominante, torna Dislexia altamente hereditária, o que justifica que se repita nas mesmas famílias;
que o disléxico tem mais desenvolvida área específica de seu hemisfério cerebral lateral-direito do que leitores normais. Condição que, segundo estudiosos, justificaria seus "dons" como expressão significativa desse potencial, que está relacionado à sensibilidade, artes, atletismo, mecânica, visualização em 3 dimenões, criatividade na solução de problemas e habilidades intuitivas;
que, embora existindo disléxicos ganhadores de medalha olímpica em esportes, a maioria deles apresenta imaturidade psicomotora ou conflito em sua dominância e colaboração hemisférica cerebral direita-esquerda. Dentre estes, há um grande exemplo brasileiro que, embora somente com sua autorização pessoal poderíamos declinar o seu nome, ele que é uma de nossas mentes mais brilhantes e criativas no campo da mídia, declarou: "Não sei por que, mas quem me conhece também sabe que não tenho domínio motor que me dê a capacidade de, por exemplo, apertar um simples parafuso";
que, com a conquista científica de uma avaliação mais clara da dinâmica de comando cerebral em Dislexia, pesquisadores da equipe da Dra. Sally Shaywitz, da Yale University, anunciaram, recentemente, uma significativa descoberta neurofisiológica, que justifica ser a falta de consciência fonológica do disléxico, a determinante mais forte da probabilidade de sua falência no aprendizado da leitura;
que o Dr. Breitmeyer descobriu que há dois mecanismos inter-relacionados no ato de ler: o mecanismo de fixação visual e o mecanismo de transição ocular que, mais tarde, foram estudados pelo Dr. William Lovegrove e seus colaboradores, e demonstraram que crianças disléxicas e não-disléxicas não apresentaram diferença na fixação visual ao ler; mas que os disléxicos, porém, encontraram dificuldades significativas em seu mecanismo de transição no correr dos olhos, em seu ato de mudança de foco de uma sílaba à seguinte, fazendo com que a palavra passasse a ser percebida, visualmente, como se estivesse borrada, com traçado carregado e sobreposto. Sensação que dificultava a discriminação visual das letras que formavam a palavra escrita. Como bem figura uma educadora e especialista alemã, "... É como se as palavras dançassem e pulassem diante dos olhos do disléxico".
A dificuldade de conhecimento e de definição do que é Dislexia, faz com que se tenha criado um mundo tão diversificado de informações, que confunde e desinforma. Além do que a mídia, no Brasil, as poucas vezes em que aborda esse grave problema, somente o faz de maneira parcial, quando não de forma inadequada e, mesmo, fora do contexto global das descobertas atuais da Ciência.
Dislexia é causa ainda ignorada de evasão escolar em nosso país, e uma das causas do chamado "analfabetismo funcional" que, por permanecer envolta no desconhecimento, na desinformação ou na informação imprecisa, não é considerada como desencadeante de insucessos no aprendizado.
Hoje, os mais abrangentes e sérios estudos a respeito desse assunto, registram 20% da população americana como disléxica, com a observação adicional: "existem muitos disléxicos não diagnosticados em nosso país". Para sublinhar, de cada 10 alunos em sala de aula, dois são disléxicos, com algum grau significativo de dificuldades. Graus leves, embora importantes, não costumam sequer ser considerados.
Também para realçar a grande importância da posição do disléxico em sala de aula cabe, além de considerar o seríssimo problema da violência infanto-juvenil, citar o lamentável fenômeno do suicídio de crianças que, nos USA, traz o gravíssimo registro de que 40 (quarenta) crianças se suicidam todos os dias, naquele país. E que dificuldades na escola e decepção que eles não gostariam de dar a seus pais estão citadas entre as causas determinantes dessa tragédia.
Ainda é de extrema relevância considerar estudos americanos, que provam ser de 70% a 80% o número de jovens delinqüentes nos USA, que apresentam algum tipo de dificuldades de aprendizado. E que também é comum que crimes violentos sejam praticados por pessoas que têm dificuldades para ler. E quando, na prisão, eles aprendem a ler, seu nível de agressividade diminui consideravelmente.
O Dr. Norman Geschwind, M.D., professor de Neurologia da Harvard Medical School; professor de Psicologia do MIT - Massachussets Institute of Tecnology; diretor da Unidade de Neurologia do Beth Israel Hospital, em Boston, MA, pesquisador lúcido e perseverante que assumiu a direção da pesquisa neurológica em Dislexia, após a morte do pesquisador pioneiro, o Dr. Samuel Orton, afirma que a falta de consenso no entendimento do que é Dislexia, começou a partir da decodificação do termo criado para nomear essas específicas dificuldades de aprendizado; que foi elegido o significado latino dys, como dificuldade; e lexia, como palavra. Mas que é na decodificação do sentido da derivação grega de Dislexia, que está a significação intrínsica do termo: dys, significando imperfeito como disfunção, isto é, uma função anormal ou prejudicada; elexia que, do grego, dá significação mais ampla ao termo palavra, isto é, comoLinguagem em seu sentido abrangente.
Por toda complexidade do que, realmente, é Dislexia; por muita contradição derivada de diferentes focos e ângulos pessoais e profissionais de visão; porque os caminhos de descobertas científicas que trazem respostas sobre essas específicas dificuldades de aprendizado têm sido longos e extremamente laboriosos, necessitando, sempre, de consenso, é imprescindível um olhar humano, lógico e lúcido para o entendimento maior do que é Dislexia.
Dislexia é uma específica dificuldade de aprendizado da Linguagem: em Leitura, Soletração, Escrita, em Linguagem Expressiva ou Receptiva, em Razão e Cálculo Matemáticos, como na Linguagem Corporal e Social. Não tem como causa falta de interesse, de motivação, de esforço ou de vontade, como nada tem a ver com acuidade visual ou auditiva como causa primária. Dificuldades no aprendizado da leitura, em diferentes graus, é característica evidenciada em cerca de 80% dos disléxicos.
Dislexia, antes de qualquer definição, é um jeito de ser e de aprender; reflete a expressão individual de uma mente, muitas vezes arguta e até genial, mas que aprende de maneira diferente...
Disgrafia é uma inabilidade ou atraso no desenvolvimento da Linguagem Escrita, especialmente da escrita cursiva. Escrever com máquina datilográfica ou com o computador pode ser muito mais fácil para o disléxico. Na escrita manual, as letras podem ser mal grafadas, borradas ou incompletas, com tendência à escrita em letra de forma. Os erros ortográficos, inversões de letras, sílabas e números e a falta ou troca de letras e números ficam caracterizados com muita frequência... Ler mais sobre>
Discalculia - As dificuldades com a Linguagem Matemática são muito variadas em seus diferentes níveis e complexas em sua origem. Podem evidenciar-se já no aprendizado aritmético básico como, mais tarde, na elaboração do pensamento matemático mais avançado. Embora essas dificuldades possam manifestar-se sem nenhuma inabilidade em leitura, há outras que são decorrentes do processamento lógico-matemático da linguagem lida ou ouvida. Também existem dificuldades advindas da imprecisa percepção de tempo e espaço, como na apreensão e no processamento de fatos matemáticos, em sua devida ordem...Ler mais sobre>
Deficiência de Atenção - É a dificuldade de concentrar e de manter concentrada a atenção em objetivo central, para discriminar, compreender e assimilar o foco central de um estímulo. Esse estado de concentração é fundamental para que, através do discernimento e da elaboração do ensino, possa completar-se a fixação do aprendizado. A Deficiência de Atenção pode manifestar-se isoladamente ou associada a uma Linguagem Corporal que caracteriza a Hiperatividade ou, opostamente, a Hipoatividade...Ler mais sobre>
Hiperatividade - Refere-se à atividade psicomotora excessiva, com padrões diferenciais de sintomas: o jovem ou a criança hiperativa com comportamento impulsivo é aquela que fala sem parar e nunca espera por nada; não consegue esperar por sua vez, interrompendo e atropelando tudo e todos. Porque age sem pensar e sem medir conseqüências, está sempre envolvida em pequenos acidentes, com escoriações, hematomas, cortes. Um segundo tipo de hiperatividade tem como característica mais pronunciada, sintomas de dificuldades de foco de atenção. É uma superestimulação nervosa que leva esse jovem ou essa criança a passar de um estímulo a outro, não conseguindo focar a atenção em um único tópico. Assim, dá a falsa impressão de que é desligada mas, ao contrário, é por estar ligada em tudo, ao mesmo tempo, que não consegue concentrar-se em um único estímulo, ignorando outros...Ler mais sobre>
Hipoatividade - A Hipoatividade se caracteriza por um nível baixo de atividade psicomotora, com reação lenta a qualquer estímulo. Trata-se daquela criança chamada "boazinha", que parece estar, sempre, no "mundo da lua", "sonhando acordada". Comumente o hipoativo tem memória pobre e comportamento vago, pouca interação social e quase não se envolve com seus colegas...Ler mais sobre>
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Dislexia. 1ª parte entrevista en ETB2
Entrevista sobre la dislexia a Eduardo Herrera en Etb2.Durante la entrevista se describen los síntomas y un nuevo programa para el entrenamiento lector: la pizarra dinámica de lecto escritura.
Ubiratan Brasil
Hoje são lembrados os 122 anos de nascimento do escritor português Fernando Pessoa - e, por que não?, também de Alberto Caeiro, Álvaro de Campos, Ricardo Reis e Bernardo Soares, seus famosos heterônimos, seus poetas inventados. Assim desdobrado em vários, Pessoa conseguiu confundir a relação entre autoria e personalidade, vida e obra, sentimento e expressão. Atento a essa complexa rede armada pelo poeta que, à medida que experimentava na escrita também buscava a própria voz, o pesquisador e crítico Fernando Cabral Martins organizou o Dicionário de Fernando Pessoa e do Modernismo Português, portentoso volume que a editora Leya lança amanhã.
São mais de 600 artigos reunidos escritos por estudiosos renomados (como a brasileira Leyla Perrone-Moisés e o americano Richard Zenith) em quase mil páginas que, a partir da obra do poeta, contextualizam aquele movimento literário em Portugal, que não apenas modificou as artes mas a sociedade como um todo. O ponto de partida é a data da primeira aparição pública de Pessoa, 1912, e ruma até o ano de sua morte, 1935. Nesse período, ele se relacionou com ciência, alquimia, linguística e outras matérias.
O fruto dessa interação resultou em poesia, ficção, teatro, filosofia e teoria, que revelam a descoberta de obsessões que lhe marcaram toda a obra. E, por extensão, caracterizam com solidez o modernismo português. "Pessoa é que tornou o dicionário viável", disse Cabral Martins, em entrevista à imprensa de Lisboa. "Não era possível fazer um dicionário coerente sobre um tema demasiado vasto. Seria como, por exemplo, fazer um dicionário sobre a verdade ou sobre o espírito humano."
Amigo íntimo. Pessoa era um homem reservado, misterioso até. E, mesmo quando confessava isso em sua escrita, pouco revelava: "Não tenho amigos verdadeiramente íntimos, e mesmo que houvesse um amigo íntimo, como o mundo o entende, ainda assim não seria íntimo no sentido em que eu entendo a intimidade", escreveu. "Um amigo íntimo é um dos meus ideais, um dos meus sonhos, mas um amigo íntimo é algo que nunca terei. Nenhum temperamento se adapta ao meu; não há um caráter neste mundo que dê o mais leve indício de se aproximar do que eu sonho num amigo íntimo."
Essa atmosfera de indefinição também marca boa parte da obra de Pessoa. No verbete "loucura" encontrado no dicionário, sua autora, Patrícia da Silva Cardoso, identifica esse conjunto de dúvidas como uma barreira cuja função "é sublinhar a distância que separa o gesto de olhar o mundo da intenção de compreendê-lo, de compreender a si próprio".
Segundo ela, Pessoa via a loucura como um índice de singularidade e de superioridade. Ele distinguia, porém, a loucura positiva, criadora, da patológica, que serve apenas para a destruição. No livro Mensagem, por exemplo, as várias formas de loucura positiva orientam as ações dos homens que "ajudaram a inventar um país que foi e que voltará a ser senhor de si mesmo quando novamente houver aquela simbiose entre a coletividade e o grande louco". É Dom Sebastião esse louco, o rei que, ao desaparecer aos 24 anos de idade, em 1578, carrega consigo na sua morte a tragédia da própria nação, que com ele termina caindo sob domínio da Espanha.
Mensagem foi escrito em sua fase mais transcendental. É seu único livro em língua portuguesa, composto durante um período de mais de 20 anos - entre 1913 e 1934. Nessa fase, Pessoa desenvolveu uma íntima relação com a astrologia, como mostra o verbete escrito por Paulo Cardoso. Segundo ele, o poeta via nos signos uma estrutura filosófica e um meio de autoconhecimento. Também era uma plataforma de apoio na planificação de sua própria obra: "Na segunda das três partes de Mensagem, ele agrupou 12 poemas que são, no seu conjunto, e exatamente com a mesma sequência, uma compilação das características simbólicas dos 12 signos do zodíaco."
Dilemas. Figura complexa, criador de tantos "eus", Fernando Pessoa construiu uma obra singular, baseada na própria individualidade, seus limites, enganos e dilemas. Também deixou poucas pistas sobre seus reais pensamentos. "Quando alguém afirma que Pessoa acreditava, convictamente, na astrologia, na Rosa-Cruz, na cabala, no cristianismo, no paganismo, no espiritismo ou em qualquer outro "ismo", é porque não leu bem toda a sua obra", disse Richard Zenith ao Estado em 2006, quando do lançamento de seu Escritos Autobiográficos, Automáticos e de Reflexão Pessoal (A Girafa).
"O poeta acreditava em cada uma destas doutrinas, e duvidava delas todas. E todas, por sua vez, eram formas de Pessoa duvidar da sua opção literária. Da mesma maneira que os heterônimos se contrapunham e contradiziam, assim acontecia com as crenças de Pessoa, e com as suas formas de entender e até de duvidar."
Assim, apesar de volumoso e consistente, o dicionário coordenado por Fernando Cabral Martins oferece algumas das mais importantes perspectivas dessa trajetória excepcional. Nada, porém, de conclusões definitivas - afinal, como dizia o próprio poeta, "todas as frases do livro da vida, se lidas até ao fim, terminam numa interrogação".
TRECHO
"Como Fernando Pessoa, é citadino e celibatário. Mantém à distância a sua noiva Felice pelas mesmas razões pelas quais Pessoa se afasta de...
...Ofélia: para realizar o seu destino de escritor. Dedica ao mundo exterior um interesse quase nulo, e sente a mesma dificuldade de viver. Atingidos por uma profunda insegurança ontológica, Kafka (foto) e Pessoa sabem ambos o que é a perda da identidade e de referências, naquela sociedade do princípio do século posta em desassossego pela Modernidade e pelo declínio dos valores metafísicos. À crise da Modernidade sobrepõe-se a crise existencial de um escritor dividido por várias línguas - Kafka está, pelo nascimento, no ponto de encontro de duas línguas, o alemão e o checo, e, depois, familiariza-se com o iídiche e o hebraico - sempre obcecado pelo olhar do outro."
Poema de Fernando Pessoa com Paulo Autran
Mônica Manir
Nicomedes é nome de porte. "Aquele que planeja a vitória", explica Tião. Também é nome de uma concoide, a concoide de Nicomedes, curva plana constituída por dois ramos situados em lados opostos de uma reta assíntota que intimida inclusive o dicionário. Na régua, Tião nunca planejou seu destino. Nascido há 42 anos em Assis, perdeu os pais aos 12, foi criado por uma irmã missionária de voto perpétuo, abandonou a Escola de Aprendizes-Marinheiros, virou churrasqueiro de churrascaria, pedreiro de obra, saqueiro da Zona Cerealista, candidato a atleta e chapa de caminhão. Mas não esperava ? nem de longe ? que seu destino envergaria como envergou em fevereiro de 2003, quando Sebastião Nicomedes de Oliveira caiu de uma altura de 6 metros na frente de uma loja da Rua Oriente, onde tentava emplacar o primeiro luminoso da sua recém-aberta Oliveira Arte Comunicação Visual. Sem nenhum aparato de segurança, ele ainda deu a boa sorte de bater num toldo, mas a má de receber por cima a placa, a furadeira e tudo o mais que seus colegas deixaram cair na tentativa ? diz ele ? de tentar segurá-lo. Em reta descendente, Tião raciocinou: "Não posso cair sentado, não posso cair de costas, não posso cair de lado, não posso cair de cabeça, tenho de cair de pé. Tenho de morrer em pé". Acordou na esquina da Oriente com a Dr. Ricardo Gonçalves sobre a mão esquerda dobrada em "Z", o calcanhar direito meio enviesado e a cabeça fora de prumo. Mas não tinha morrido na frente da loja?
Quase. A sem-vergonhice de seus colegas e do dono do estabelecimento o arrastou até a esquina, de onde ele mesmo pediu ajuda pelo celular. Os bombeiros, informados de que Tião havia sido atropelado por moto ou carro, o levaram para o Vermelhinho, o hospital do SUS Vereador José Storopolli, no Parque Novo Mundo. Ali hibernou por oito dias, sem um alô sequer de Simone, a mulher que chamava de noiva. Saiu com o braço esquerdo engessado até o sovaco e uma bota no calcanhar. Na mão livre, amostras de remédio e um pedido médico para cirurgia no Hospital São Paulo. O pé só estava trincado, mas o punho precisava de uma placa de platina. Tião se lembrava bem do endereço da sala na qual dormia e onde funcionava a sua Oliveira Arte Comunicação Visual, que, em pouco mais de uma semana, de sua já não tinha nada. Os funcionários levaram todo o maquinário e devolveram o prédio alugado ao dono. A alegação: Tião tinha ido desta pra pior.
Pascoalina, uma conhecida, ainda lhe emprestou R$ 60, que mal deram para a pensão. Sem mais valia, Tião caiu no mundo. A saída era seguir o estômago. Acabou se aboletando ao redor do Mercado Municipal, onde poderia viver de tomate, cenoura, melão, melancia, banana e o que mais despencasse das barracas. Porém a depressão era muita. "Para mim, eu era empresário e estava dormindo na calçada. Não queria aceitar a situação." Chegou a dobrar o corpo sobre a grade do Viaduto do Chá, mas tinha medo de morrer, mesmo achando que morto já estava. Sua bênção era a mão torta. Por causa dos antibióticos e dos anti-inflamatórios, não botou álcool na boca. Se tivesse uma convulsão, tomaria outro prejuízo.
Depois de dois meses, procurou uma irmã que mora em Caraguatatuba. Recebeu calor e comida, mas a dor no punho era insuportável e ele voltou à capital para tentar a operação. No vai não vai da saúde brasileira, refugiou-se num albergue, que para ele pouca diferença tem da rua, com a pessoa desligada a cada amanhecer. Enfim, a operação saiu. A fisioterapia ficou para o dia de são nunca. Tião entendeu que procurar os parentes seria pior. "Tem irmão alimentando os filhos e chega você, adulto, naquela situação complicada." Tocou a vida em duras temporadas alberguianas, sempre iluminadas pela escrita. Além de correr como um Forrest Gump, Tião gostava de cravar os sentimentos no papel. O primeiro atrapalhado que o viu escrevendo acabou se tornando seu anjo. No Parque Dom Pedro II, o tal andarilho mandou ver: "Letrado, escreve aí uma carta para a minha mãe". Então deu a ideia da literatura como profissão: "Ela pode mudar sua vida e pode mudar a nossa".
Em 2007, Tião escreveu o livro de poesias Cátia, Simone e Outras Marvadas, publicado pelo Coletivo Dulcinéia Catadora, que divulga material artístico produzido por moradores de rua. A Cátia é mistério, a Simone é aquela e, entre as outras marvadas, prima a bebida: "A pinga pede o corpo/ que pede o chão/ que pede o corpo/ que pede a pinga se o corpo cai". Tião também escreveu o monólogo Diálogo dum Carroceiro, interpretado pelo ator Antonio Carlos de Niggro e apresentado inclusive para o presidente Lula. Hoje o texto roda por espaços alternativos, com O Homem sem País, outro monólogo de Tião, estrelado por ele mesmo. No cartaz, a linha fina tenta explicar o título: "O que é cidade de origem para quem não tem mais para onde ir?"
Desova. "Quis dizer que o morador de rua muitas vezes não volta porque bate a vergonha de se apresentar à família como fracassado, o amigo de infância vai ver que a pessoa não virou artista", afirma. Além disso, o andarilho fica numa cidade só até ser descoberto. Então passa a ser cutucado e transferido de cá pra lá, de lá pra cá, em peruas de desova. "Hoje a principal rota de despejo no Estado é Campinas. Se ela não pode atender, os moradores são largados em São Paulo", afirma. Também por isso, pela movimentação incessante dessa população por vontade própria ou alheia, Tião questiona os números da última pesquisa da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe) sobre pessoas em situação de rua em São Paulo, divulgada nessa semana. O estudo foi feito entre novembro e dezembro, durante o verão portanto, quando moradores de rua descem para o litoral fugindo especialmente do abafo dos albergues. Ele também duvida do número de pessoas levantado pelo estudo ? 13.666. "São mais de 18 mil, a pesquisa se concentrou no centro de São Paulo e não considerou os desabrigados de outros bairros, como São Miguel, Santo Amaro, Penha, onde a população de rua cresceu muito."
Nesse momento Tião não fala como poeta, ator, dramaturgo ou enxerido, mas como um dos fundadores do Movimento Nacional da População de Rua (MNPR), formalizado após o massacre da Sé, em agosto de 2004, no qual moradores foram golpeados enquanto dormiam, sete deles mortalmente. Durante o assassinato, aliás, Tião recebeu ligações de desespero pelo celular vindos da praça. "No caso da Isabella Nardoni a perícia provou quem foram os assassinos. No caso do massacre..." Falando em traumas, ele parece ter superado a queda do andaime, tanto que trabalha em outra esquina da Rua Oriente como oficineiro na Casa Restaura-me, mantida pela ONG católica Aliança de Misericórdia, no bairro do Brás. A casa oferece atividades gratuitas de artesanato para os moradores de rua, que fazem brinquedos, tapetes, colares, porta-vasos. Tião fica por ali oferecendo material, sugerindo o que pode vir a ser divulgado no site da instituição, apartando desentendimentos, dando um norte para quem está perdido da silva.
Wellington chegou devaneado no meio da entrevista, de mochila murcha nas costas e saliva nervosa no canto da boca. Disse que tinham roubado seu telefone e seu violino, mas que ele toca de tudo, de flauta a reco-reco. É só dar a oportunidade. Está num albergue porque a coisa ferveu em casa depois de uma briga com o padrasto. "Foi um rato de mocó que pegou suas coisas, né?", perguntou Tião. Wellington fez que sim. "Esse vai ser prego por um tempão, até aprender a viver na rua", disse Tião, na saída do menino. Prego é a presa dos ratos de mocó, muitos deles ex-cadeieiros que habitam a região.
À saída da Restaura-me, lá estava Marcelo-médico-veterinário-em-situação-de-rua-nice-to-meet-you, alternando frases em inglês e francês, com leves erros de concordância. Tião alerta para as noias dos frequentadores do lugar, porém não descarta as verdades. "As autoridades tendem a achar que um morador de rua falando é como se estivesse louco, delirando ou mentindo." Ele não conhece Marcelo, mas se lembra de um médico diplomado que foi pra rua depois do desgosto de perder o filho numa mesa de operação. Fato é que também recorda uma mulher que se dizia Ana Paula Arósio, vinda da Itália nos braços do Gianecchini. Concorda com a pesquisa da Fipe quando ela diz que muito morador teve carteira assinada. "O problema é que vários desses nem sabem mais reconhecer o próprio nome na carteira."
Rumamos para uma rua que desemboca na Sé, onde Tião participa de um projeto de criação e pesquisa em fotografia chamado Trecho 2.8. O projeto é uma parceria do Instituto Brasis com o Instituto Gens e pretende, como afirma Edson Fragoaz, um dos responsáveis, "viabilizar condições para os adultos em situação de rua terem assegurado o direito à comunicação do que sentem e pensam". Nessa quarta-feira, nove deles sairiam novamente pelo centro para clicar com as máquinas digitais oferecidas pelo projeto. Edson sugeriu um único lugar para todos. Em vão. "A República? Cruel! Com aquela cegonha de ferro?"; "O Arouche? Qual a graça de flor de floricultura?". Saíram a esmo, mas com o compromisso de voltar às 16h30.
Muitos chegaram com fotos de passarinhos em busca de migalhas, belos reflexos distorcidos, flores desabrochando, esguichos psicodélicos, fachadas recortadas, cartazes de agências de turismo. "Não parece que estou em Paris?", sorri Márcio diante de uma Torre Eiffel estourada na máquina. Marilza trouxe novas encruzilhadas, como se estivesse a procurar seu canto, ela que veio do Maranhão atrás de peixes herbívoros. Poucos, como os três desta página, flagraram moradores de rua. Marli fez isso com maestria, mas não permitiu a divulgação. Está esperando o momento certo da glória.
Tião registrou um passado que às vezes revisita em busca de inspiração. "Passo a noite de boa na rua, o lugar me ativa a memória." O bolsa-aluguel, mais a bolsa do curso de fotografia, mais a grana como oficineiro, mais o cachê esporádico de O Homem sem País lhe permitiram alugar um quarto e sala na Penha. Em lan houses, ele atualiza seu diariotiao.zip.net, "o blog que mostra a realidade das ruas de São Paulo". Mora com seus livros prediletos: Germinal, A Revolução dos Bichos, O Diário de Anne Frank e outros que ganha em lançamentos. Filhos? "Achei que tive em duas situações, mas acabei brigando e, na incerteza, ficou assim." Namorada? "Tenho." Um tenho meio sem convicção. Mostra a foto dela no celular. "É uma psicóloga, a gente se conheceu numa festa na Vila Madalena, mas ela sempre foi classe média. Tem vezes em que não consigo acompanhar."
As quatro décadas que separam a primeira tira de Mafalda do livro Que Presente Inapresentável não mudaram a forma de Quino interpretar o mundo. Nos anos 60, ao ouvir que a TV era "veículo de cultura", Mafalda concluía: "Se fosse a cultura, descia do carro e ia a pé." Em cartum da coletânea lançada em 2004, um homem constata, aturdido: "Graças à internet, agora posso ler a imprensa internacional e saber na hora que horror está o mundo."
Três títulos que saem agora no Brasil - 10 Anos com Mafalda, com todas as tiras da personagem, publicadas entre 1964 e 1973, Humanos Nascemos, original de 1987, e Que Presente Inapresentável - permitem perceber como Quino encontrou diferentes maneiras de reiterar suas convicções ao longo da carreira. E foi por essa eficácia em retratar a evolução das mazelas do mundo que causou tamanha repercussão seu anúncio, em abril do ano passado, de que ficaria um tempo sem desenhar para "renovar ideias".
"Sigo desenhando coisas para mim. O que não estou é publicando neste momento", afirmou Quino, de Buenos Aires, em entrevista por telefone ao Estado, na última semana. "Estou sempre buscando temáticas que ainda não tenha abordado, e isso é muito difícil. É algo sobre o que prefiro não falar porque ainda não sei qual é a via a seguir."
Quem acompanha de perto a trajetória do autor, no entanto, sabe que há outra razão para a pausa. Há dois meses, o cartunista passou por uma cirurgia no olho direito devido ao glaucoma do qual sofre. Não foi a primeira vez que se submeteu a operação contra a doença, que pode levar à cegueira; nos últimos anos, passou por uma série delas. Daniel Divinsky, editor de Quino na Argentina, já chegou a sentenciar: "Creio que o ‘até logo’ disfarce um ‘até nunca’. Para ele, é uma decisão dolorosa. O glaucoma foi se agravando, ele não vê com precisão para desenhar bem e fica insatisfeito com o que faz."
Mas novas publicações do artista estão prometidas. A Ediciones de la Flor, que o publica na Argentina, afirma ter material para lançar uma série temática. Também por aqui deve sair, sem data definida, uma preciosidade. Trata-se de Mundo Quino: primeiro volume com cartuns do argentino, de 1963, cujo prefácio da edição argentina dos anos 90 inclui um mea-culpa do autor. No texto, ele diz ser "estranha a sensação" de reencontrar um Quino com o qual se identifica e do qual se sente diferente. "Por um lado, era capaz de uma simplicidade e uma frescura que hoje invejo. Por outro, descubro-me autor de desenhos de um racismo que, para ser brando comigo, qualificaria de inconsciente, mas não menos detestável", escreve.
Pessimismo. Hoje, Quino diz acreditar que não mudou. Ao menos, avalia, não se tornou mais pessimista do que era. "O mundo foi que mudou para pior, em especial após o 11 de Setembro, quando perdemos segurança. A política também piorou, perdeu muito terreno frente ao poder econômico", argumenta. Mas parecia mais otimista o cartunista que, em 1987, na entrevista de abertura do volume 10 Anos com Mafalda, dizia acreditar que a "inteligência humana saberá sobrepor-se a todos os perigos".
Nos dias atuais, a inteligência humana lhe parece uma praga. Na conversa com a reportagem, Quino reproduz argumentos negativos sobre os transgênicos ("Me parece que está muito mal regulado, ninguém controla como deveria fazer"). a internet ("Ela cria um excesso de informação entre gente que não se comunica pessoalmente, e isso me parece bastante triste"), o futebol ("Não há outro esporte que provoque tantas mortes e violência como ele. Me interessa só como fenômeno social") e a projeção internacional do Brasil ("Isso foi algo já programado desde os tempos do Kissinger"). Proprietário de apartamentos em Buenos Aires, Madri, Paris e Milão, casado há 50 anos com a mesma mulher, Alicia Colombo, e admirador de vinhos e de boa comida, Quino parece ao menos interessado em tentar retirar do mundo o que de bom, apesar de tudo isso, ele ainda pode lhe oferecer.
10 Anos Con Mafalda
Autor: Quino. Editora; Martins Fontes (R$ 52 - 193 páginas).
Humanos Nascemos
Autor: Quino. Editora: Martins Fontes (R$ 45 - 126 páginas).
Que Presente Inapresentavel!
Autor: Quino. Editora: Martins Fontes. (R$ 36 - 134 páginas).